AIDS: O Ocidente está desmoronando...

O fim da Segunda Grande Guerra deixou à humanidade um grande hiato civilizacional, desde o inicio da Primeira Grande Guerra o homem conheceu a dor da guerra total. A memória do homem ocidental via longe os bons tempos da Belle Époque, onde a Europa era o coração do mundo. Com o fim da Segunda Guerra o mundo precisa ser reconstruído novamente, e agora em bases sólidas, que não ruíssem ao primeiro abalo socioeconômico. São os tempos da Guerra Fria e as décadas de 1950 e 1960 operam revoluções: a revolução social, a revolução cultural. As economias, em geral, crescem em ritmo frenético. Como nos fala o guru da História do século XX, Eric Hobsbawm, esta é a ERA de OURO.

Mas, como diz o poeta, nada dura pra sempre, os anos 1970 começam meio conturbados, há uma severa crise econômica e os reflexos das revoluções socialistas e da guerra do Vietnã abalam alguns elementos constitutivos do pensamento ocidental. E neste contexto de evolução/”perturbação” sociocultural que surge, no final dos anos 1970, a doença que ressuscitaria os velhos medos do Ocidente: a AIDS.

A Aids aparece num contexto de liberação sexual e de conquistas sociais das minorias, os homossexuais principalmente, ocorridas a partir da metade do século XX. Essa onda reformista de caráter sócio-comportamental atinge os lares de boa parte dos ocidentais, ate mesmo a classe média de cidades do interior como é o caso de Passo Fundo.

E é em janeiro de 1985, que os principais jornais desta cidade, O Nacional e Diário da Manhã, noticiam o primeiro caso confirmado de soropositivo. Para Michel Pollak, a doença é motor de mudanças imediatas na vida social e “as discussões sobre as eventuais medidas administrativas a serem tomadas contra essa doença colocam em relevo as repercussões políticas” da epidemia; e o local onde estas repercussões pulsam são os jornais.

A doença aqui é a peça que aciona as rupturas com aquela liberalização sexual adquirida nas décadas anteriores. A doença funciona como o ser gerador de medos, conflitos e transformações; é sobre ela que se forjam discursos baseados em distorções da ciência biológica, onde se entrincheiram preconceitos e juízos de valor que atingem o meio social, influenciando-o, reformulando as suas relações interpessoais.

Durante todo mês de janeiro e nos meses, anos subsequentes, os jornais noticiam o drama das famílias, da comunidade médica e principalmente dos infelizes portadores desta cruel doença. São eles quem mais sofrem, e isto é óbvio, as dores da doença. Porem não são apenas as dores físicas, o medo da morte e, talvez, pior ainda, o dor de ser apontado, a dor do preconceito, que é inflamado pelo olhar de mentes pérfidas, que julgam as pessoas como se elas fossem aberrações da natureza, a cria do pecado. A ciência médica durante bom tempo vai lembrar também dar análises errôneas sobre esta doença, analises estas com um fundo de preconceito, de homofobia. Atualmente a ciência não acredita mais nos estúpidos “grupos de risco”. A doença se alastrou, condenou muita gente a morte, mas hoje, graças a avanços da ciência, das políticas de prevenção (que tem de ser revistas e ampliadas) e das políticas de tratamento, o soropositivo consegue viver de uma forma mais ou menos normal, com uma certa qualidade de vida, que infelizmente os primeiros atingidos pela doença não puderam desfrutar.

Carlos Eduardo Pimentel
Acadêmico do 6º nível do Curso de História
Fonte: Acervo AHR

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