Política acima do poncho: Brizola e o PTB
As eleições municipais de 1959 foram, sem dúvida nenhuma, as mais acirradas do pós-1945, transformando Passo Fundo numa verdadeira “praça de guerra”. O PTB, partido então hegemônico, protagonizou uma cisão que o levou a dividir-se em duas facções: a Executiva liderada por César Santos, presidente do partido e a Ala Rebelde sob o comando do deputado federal Daniel Dipp.
Desde meados de 1957 o trabalhismo local vinha passando por graves e conturbados desentendimentos por disputa de poder, processo que sofreu a interferência direta da Executiva Estadual, e do então governador do Estado Leonel Brizola na tentativa de reverter a difícil situação. Vários mediadores aqui vieram em busca de uma “pacificação da companheirada”, mas a intransigência das partes minou qualquer possibilidade de paz. As “queixas” principais eram as mesmas que ocorriam em âmbito nacional: centralismo e personalismo com que os “donos do partido” conduziam aquela agremiação. César Santos estava à frente do trabalhismo local desde sua criação em 1945.
Sem acordo, a Ala Rebelde partiu em busca de uma legenda sob a qual filiar-se com o intuito de concorrer nas eleições municipais com candidaturas próprias. Houve a aproximação com o PSP e o PDC, possibilidades estas inviáveis devido a aliança que existia com o PTB. A única alternativa encontrada foi o recém criado Partido Trabalhista Nacional (PTN), abrigo dos dissidentes petebistas, a exemplo de Fernando Ferrari, que rompera com o partido em nível nacional.
O registro das candidaturas de Mario Menegaz e Daniel Dipp ao Executivo, e dos demais componentes do grupo ao Legislativo sob a nova legenda foi a gota d’água. Segundo a imprensa local, “a guilhotina trabalhista fez rolar uma dúzia de cabeças”. Foi expulsa do PTB toda a Ala Rebelde.
A filiação dos rebeldes fora das fileiras petebistas foi também o desfecho que Brizola esperava para vir à Passo Fundo. Decepcionado com seus correligionários que não aceitaram uma conciliação, sua palavra de ordem clara e direta foi de combate às candidaturas dissidentes que ousaram quebrar a unidade e coesão getulista. Votar neles seria votar “contra mim”, afirmou. Os nomes de sua confiança eram Benoni Rosado e Sinval Bernardon, pela Coligação PTB-PSP-PRP.
Em defesa da fidelidade partidária, afirmou que “mesmo que o partido erre tem que se votar no partido” e a obediência é regra a ser cumprida. Para Daniel Dipp, porém, o correto seria assim proceder se as decisões fossem tomadas em conjunto, mas nunca como imposição de um grupo sobre a vontade de uma maioria, numa referência a forma como foi conduzido o processo de pacificação das partes.
Para Bittencourt de Azambuja, também candidato ao executivo pela aliança PSD-UDN-PL-PDC, a postura de Brizola veio proporcionar um “inédito espetáculo de degradação cívica”, descendo da alta dignidade de seu cargo para intrometer-se de forma “tutelar, indébita, abusiva e ilegal” numa campanha que era somente do município.
Ferrari, em apoio a Ala Rebelde liderou um comício em Passo Fundo, incorporando-se à sua luta e solicitando aos que confiavam em suas idéias que votassem em Menegaz-Dipp.
Alheio as conturbadas manifestações políticas de repúdio à sua ação de intermediação pessoal às candidaturas da Executiva, no palanque trabalhista em alto e bom som, Brizola declarou que se enganava com o governo quem queria se enganar, pois não fazia “política debaixo do ponche”.
Depois desse fato, “as facções em luta aberta” tornaram ainda mais tenso o panorama político, mas a força do partido de Vargas e de Brizola elegeram Benoni Rosado e Sinval Bernardon, últimos candidatos eleitos sob a sigla do PTB antes do golpe militar de 1964.
Sandra Benvegnú
Mestre em História
Fonte: Acervo AHR