A questão da segurança pública em Passo Fundo (1921)
Andrei Tonini
Mestrando em História - UPF
Ao desbravar-se sobre o relatório apresentado ao Conselho Municipal pelo então intendente de Passo Fundo, Dr. Nicolau Araújo Vergueiro, constata-se que a questão da segurança pública não é uma questão pós-moderna no município. O documento datado de 1° de novembro de 1921 aponta as dificuldades e os problemas enfrentados pela municipalidade para prestar um serviço público adequado à população.
Logo na introdução do documento, o intendente apresenta a situação da então Guarda Municipal como quase uma calamidade: estavam sem armas, sem fardamento, sem equipamentos, sem cavalos e com apenas um quinto do efetivo normal. Ao iniciar o capítulo que trata da segurança pública, o intendente trata de remeter ao assunto tratado na introdução, informando os conselheiros da compra de fardamento e equipamentos, “colocando-se essa força em condições de desempenhar cabalmente o seu papel de alta importância para a ordem pública”. O alarde inicial de Vergueiro aparenta ser uma estratégia do intendente: mostrar aos conselheiros uma situação caótica, para depois não gerar questionamentos acerca do investido na armada, além de aumentar sua popularidade como figura pública. Entretanto, mesmo com os investimentos, o cenário da Guarda Municipal passo-fundense parece continuar em situação quase desesperadora. A organização estava composta de apenas vinte praças, dos quais dezesseis ficavam lotados na sede e os outros quatro divididos, um em cada distrito descrito. Os distritos que possuíam efetivo eram Carazinho, Não-Me-Toque, Boa Esperança (hoje, município de Colorado) e Campo do Meio (hoje, localizado em Gentil).
O teatro de operações da armada municipal era demasiado grande. Com uma área territorial de atuação que compreendia centenas de quilômetros quadrados a mais do que a configuração atual do município, a Guarda Municipal carecia de homens para realização de seu serviço. Esses, e entre outros motivos, levaram o intendente a solicitar aumento de orçamento ao conselho, para poder deixar pelo menos vinte praças na sede municipal.
Outro ponto muito interessante do relatório é acerca do Presídio Municipal, que enfrentava, conforme o relatório, uma situação calamitosa e, nas palavras de Dr. Nicolau Vergueiro, desumana. No início do inverno de 1921, o presídio estava sem vidros nas janelas e com as molduras apodrecidas; não haviam leitos e nem cobertas. Aqueles infelizes, como os chama o intendente, que se encontravam em cárcere, agrupavam-se nos cantos das celas para esquentar-se e desviar da chuva, vento e até mesmo da neve.
Em 21 de março de 1921, a Intendência abriu Concorrência Pública para compra de alimentos para os presos pobres, com três propostas apresentadas – ganhou a de Euthalia Pinto, que foi contratada por um ano. O intendente informou a colocação de novos caixilhos em sete janelas, com um total de 104 vidros, a construção de oito leitos e a compra de dez cobertores. Como se não bastassem todos os problemas enfrentados pelo município, o terreno onde então havia sido construído o Presídio Municipal era motivo de litígio entre Joaquim Gabriel de Oliveira Lima, já falecido na data do relatório, e o município. No processo de reivindicação, o autor Joaquim obteve sentença favorável, e na época o processo encontrava-se em fase de execução por seus herdeiros.
Falta de efetivo, de orçamento, de equipamentos, de dignidade humana no presídio. Brigas judiciais que afetavam o poder público. Parece que estamos falando sobre os dias atuais, no entanto, essa realidade da segurança pública vem se deslocando pela história, como um cavalo que galopa ao horizonte, incansável e que parece imparável. Para aqueles que gostariam de se aprofundar sobre a realidade municipal através dos anos, uma visita ao Arquivo Histórico Regional (AHR) rende a consulta a uma infinidade de fontes e documentos, como o Relatório Municipal de 1921 apresentado ao Conselho Municipal, subsídio para a obtenção das informações neste texto descritas.