“Que será do Rio?”: A mudança da capital do Rio de Janeiro para Brasília nas páginas da revista O Cruzeiro (1960)
Alex Antônio Vanin e Roberto Biluczyk
Mestrandos em História – PPGH/UPF
A partir de 1955, o Brasil experimentou uma experiência ativa de desenvolvimento. A ascensão de Juscelino Kubitschek (JK) ao poder colocou em prática o projeto nacional-desenvolvimentista que marcaria seu mandato. O Presidente defendeu o chamado Plano de Metas, conjunto de 30 objetivos a serem alcançados até o final de seu governo. JK e sua equipe levaram em conta diagnósticos de economistas, como Roberto Campos e Celso Furtado, com visões diferentes entre si, mas com ideias viáveis para a superação do subdesenvolvimento.
Juntamente com o planejamento econômico de Juscelino, outra proposta se constituiu como a “meta-síntese”: a construção de uma nova capital, Brasília, edificada e inaugurada em sua gestão. A ideia, indicada em lei desde a Constituição de 1891, previa maior desenvolvimento da região Centro-Oeste. O projeto contaria com o planejamento do renomado arquiteto Oscar Niemeyer e do igualmente reconhecido urbanista Lúcio Costa. A UDN, partido opositor, ofereceu resistências à construção da nova capital. Mesmo assim, Brasília foi solenemente inaugurada em 21 de abril de 1960.
A revista O Cruzeiro, editada no Brasil entre 1928 e 1975, foi uma das principais publicações do período. Assis Chateaubriand (1892-1968) era o proprietário da publicação e de um vasto império midiático, que incluía também a TV Tupi (1950-1980). Associada à apresentação de grande quantidade de imagens, O Cruzeiro ofereceu ao leitor, em sua edição de 07 de maio de 1960, fotos inéditas da inauguração da nova capital, enfatizando a figura de JK e o sucesso da rápida construção. “É uma cidade que se coloca entre a funcionalidade e a beleza pura”, com seus “edifícios de linhas leves e harmônicas”, segundo a reportagem.
A cidade do Rio de Janeiro se transformaria no Estado da Guanabara, em 1960. A nova organização seria extinta em 1975, sendo absorvida pelo Estado do Rio de Janeiro. Brasília, por sua vez, ficaria consolidada como a planejada capital brasileira. A mudança seria descrita pela revista como “regime de viuvez alegre” para o Rio de Janeiro, ao deixar seu status de capital para trás. Com a inauguração de Brasília, o Rio de Janeiro deixaria de ser a capital nacional, instigando a seguinte discussão: “Que será do Rio?”. A reportagem, de 23 de abril de 1960, apresenta a busca pela opinião de 28 notáveis em relação à mudança.
Entre os posicionamentos publicados sobre o tema mostra-se que o então prefeito nomeado do Distrito Federal, Sá Freire Alvim, acreditava que a cidade seguiria sua “marcha de progresso e desenvolvimento, liberta das pesadas atribuições de Capital da República”, dedicando-se, a partir de então, à indústria e ao comércio.
Enquanto a maioria dos entrevistados via com bons olhos a mudança, Carlos Lacerda (UDN), não compartilhava da mesma posição, sinalizando “séria situação caótica” para a cidade do Rio, acreditando que o Estado da Guanabara não poderia superar seus encargos. O político, entretanto, seria eleito para o cargo de governador do novo Estado, assumindo no ano seguinte.
Álvaro Moreyra, acadêmico, protestava contra piadas que visavam chamar a antiga capital de “Velhacap”. Para ele, o Rio continuaria a ser a “Cidade Maravilhosa”, título que ocupa há séculos. Por sua vez, João Goulart, Vice-presidente do Brasil, afirmou que “O Rio de Janeiro será sempre o Rio de Janeiro”. Por fim, Leonel Brizola, governador do Rio Grande do Sul, ponderou que a mudança geraria “grandes resultados em favor do Rio”, por passar a viver com “mais autonomia, com mais consciência de seus próprios problemas e responsabilidades”, tornando-se no ponto-de-vista turístico internacional, uma “Riviera tropical”.
Entre estas e outras posições, O Cruzeiro procurou representar o momento da transição da capital brasileira, enfatizando permanências e mudanças impactantes no cenário nacional. A revista possui inúmeras edições disponíveis para pesquisa local no Arquivo Histórico Regional (AHR), de Passo Fundo e, como este tema, traz inúmeras questões pertinentes para pensar o país em seu tempo de publicação.