Apresentação

Anualmente, a Anpae promove eventos, intercalando um em nível nacional com outros regionais. Em 2018, ocorrerão eventos regionais. No sistema de rodízio entre os três estados do sul, coube ao Rio Grande do Sul sediar o V Seminário, que ocorrerá de 11 a 13 de abril de 2018 na Universidade de Passo Fundo, tendo como tema “Políticas educacionais como campo de disputas: tensões entre o público e o privado”.

Por que da escolha dessa temática? O campo das políticas educacionais vem se tornando cada vez mais disputado por diferentes agentes com projetos e interesses distintos. A construção de diretos – entre os quais o da educação, resultante de duros embates nas últimas quatro décadas e consagrados em diferentes legislações como a Constituição de 1988, a LDB de 1996 e as regulamentações educacionais posteriores através de pareceres e diretrizes – está sendo ameaçada por um conjunto de decisões políticas, econômicas e legais. Fazem parte desse contexto a reforma do ensino médio, a proposta de Escola sem partido, o congelamento de investimentos por vinte anos, as sistemáticas investidas contra o Plano Nacional de Educação (2014-2024), a exclusão de representações do campo da educação no Fórum Nacional de educação, entre as quais a Anped e o Sintee. Esses são alguns dos sintomas em curso que apontam para a desestruturação das políticas educacionais públicas construídas nas últimas quatro décadas e a implantação de novas propostas, fortemente influenciadas por interesses empresariais. A educação brasileira vive uma forte tensão entre duas perspectivas distintas: uma republicana e outra privatista-mercadológica. Esses embates, no entanto, não são novos. Desde a década de 1920, intensificam-se as críticas à educação privada pelos pioneiros da escola nova que, no Manifesto de 1932, clamam pelos princípios de uma educação pública, gratuita e laica. Ao contrário desses princípios, crescem, no contexto atual, tendências de mercantilização, ocorrendo o fortalecimento de grupos empresariais que defendem um Estado mínimo quando se trata de políticas públicas, como a educação, o crescimento de instituições educativas com interesses exclusivamente mercantis e Institutos “sem fins lucrativos” que atuam em assessorias a redes públicas de educação, assumindo protagonismos no âmbito de políticas educacionais, mesmo não tendo trajetórias e experiências históricas na educação formal. Com base num discurso gerencialista, defendem projetos e propostas educacionais sem os pressupostos políticos e pedagógicos que são imprescindíveis para uma educação emancipadora, humana e cidadã.

Nesse contexto, propostas pautadas em lógicas mercantis ganham a simpatia de gestores públicos e conquistam espaços cada vez mais significativos. Em contrapartida, instituições educacionais com trajetórias consolidadas e organizações que tradicionalmente ocuparam-se da educação, entre as quais a Anpae, são marginalizadas de debates fundamentais e suas contribuições, quando não desconsideradas, são secundarizadas. Tudo isso produz uma sensação de impotência entre educadores para fazer frente aos complexos processos socioculturais, políticos e educacionais presentes na sociedade e vivenciados cotidianamente nas escolas.

Diante disso, temos de nos perguntar a respeito dos impactos dessas mudanças na educação básica. A definição legal de educação básica ainda se sustenta no contexto da reforma do ensino médio? Como fica a educação básica a partir da Base Nacional Curricular Comum que tratou em separado a educação infantil e Fundamental do ensino médio? Como avançar numa articulação orgânica entre a educação básica, a educação superior e os programas de pós-graduação lato e stricto sensu? Como o discurso gerencialista da educação está avançando sobre a educação básica? Até que ponto professores e gestores conseguem diagnosticar o que está em curso para se posicionarem propositivamente por meio de práticas que resistam à desqualificação da educação? Como enfrentar o pessimismo, o desânimo e as ameaças que envolvem gestores, professores e alunos?

A Anpae, entre outras organizações educacionais, tem de continuar contribuindo com reflexões críticas sobre os múltiplos desafios que se fazem presente nas práticas educativas e, ao mesmo tempo, precisa dar visibilidade às experiências que estão sendo produzidas em instituições educativas e em redes de educação com muitas dificuldades, mas que acenam para mudanças criativas. O V seminário constitui-se num espaço de socialização dessas experiências que precisam ser refletidas e confrontadas com as pesquisas que vem sendo produzidas, especialmente no âmbito dos programas de pós-graduação stricto sensu em Educação.

Nesse contexto, o V Seminário tem como objetivo geral discutir criticamente os desafios enfrentados pelas políticas educacionais, de modo especial a tensão entre o público e o privado, à luz das pesquisas produzidas no campo da educação e em áreas afins, dialogando com experiências educativas em construção. Como objetivos específicos, propõe-se a aprofundar os embates entre o público e o privado no âmbito da educação e suas implicações e interferências nas políticas educacionais; problematizar os pressupostos de uma educação republicana, confrontando-os com as tendências de mercantilização crescente na educação atual; socializar pesquisas e reflexões que vêm sendo desenvolvidas por educadores em distintos espaços sobre as tendências nas políticas educacionais em distintos espaços locais, nacionais e globais; e criar espaços para que experiências criativas que vêm sendo desenvolvidas em distintos espaços educativos, particularmente em redes públicas, permitam ressignificar práticas e as funções próprias da educação, visualizando perspectivas e possibilidades emancipatórias.

No ano em que a Universidade de Passo Fundo, instituição comunitária e regional, está completando cinco décadas de existência; a Faculdade de Educação, 61 anos; e o Programa de Pós-Graduação em Educação, 21 anos de atividades, sentimo-nos profundamente agraciados em acolher o V Seminário Regional sul da Anpae. Desejamos a todos que o evento constitua-se num espaço privilegiado de socialização de pesquisas e experiências educativas e possa trazer alento e energias para continuarmos lutando por uma educação capaz de formar seres pensantes e democráticos.

 

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