Por: Caroline Simor / Assessoria de Imprensa
Fotos: Divulgação
Pesquisa desenvolvida no curso de Engenharia de Alimentos da UPF estuda uma nova geleia. Saborosa, mas como menos açúcar.
Quando comemos nem sempre pensamos em todos os processos que envolvem a criação, produção e distribuição daquele produto. Alguns deles são tão comuns na rotina que o gosto, a aparência e o odor já fazem parte da cultura. Mas a indústria alimentícia tem se reinventado nos últimos anos, principalmente no sentido de buscar oferecer aos consumidores alimentos mais saudáveis e mais naturais. O curso de Engenharia de Alimentos da UPF está atento a essas mudanças e um exemplo disso é a pesquisa, feita pela acadêmica Isadora Pessuto, como seu Trabalho de Conclusão de Curso. Orientada pela professora Dra. Luciane Colla, ela estudou a proposição de geleias feitas com menos concentração de açúcar. Para marcar o Dia do Engenheiro de Alimentos e dia Mundial da Alimentação, elas contam como foi o processo.
Com afinidade nas áreas de biologia e bioquímica, Isadora escolheu o curso pensando no campo de trabalho, mas também nas experiências. Trabalhando atualmente em uma indústria de alimentos do ramo de carnes, ela foi buscar na pesquisa uma forma de expandir os conhecimentos. “Decidi fazer minha pesquisa sobre geleias por dois motivos: por ser uma área bastante diferente da área que conheço e trabalho atualmente e por ter gostado muito da disciplina de Tecnologia de Frutas e Hortaliças oferecida no curso”, explica.
Atenta as mudanças do mercado, ela decidiu propor a elaboração de um novo produto, mais saudável e natural, por isso, a ideia foi desenvolver uma geleia de erva-mate reduzida de açúcar.
Mudanças em função da pandemia
Com a chegada da pandemia da Covid-19 e o fechamento dos laboratórios, o processo prático ficou um pouco comprometido, mas isso não impediu que a acadêmica, juntamente com a orientadora, seguisse buscando a metodologia correta para fazer o produto. “Iniciamos uma pesquisa teórica, onde realizamos uma análise bibliométrica sobre estratégias tecnológicas para redução de açúcar e geleias. Lembrando que a análise bibliométrica é uma ferramenta para a busca de referências da literatura”, ressalta.
Por meio desse método, pesquisadores podem obter uma análise mais detalhada dos trabalhos publicados sobre determinado assunto. Isadora pontua que a geleia encontrada no varejo é um produto produzido a base de frutas e, normalmente, com elevada concentração de açúcar, sendo que a geleia comum é adicionada de até 60% desse ingrediente.
Ela destaca que o açúcar na geleia, além de proporcionar o gosto doce, promove a textura necessária e auxilia na conservação do produto, ou seja, reduzir ou retirar não é uma tarefa fácil. “A partir disso, e com a crescente preocupação por parte de consumidores com uma alimentação saudável, são necessários estudos nos quais ocorram a remoção parcial e/ou total de açúcares, uma vez que, as modificações na formulação da geleia não a descaracterizem. Nosso objetivo foi buscar por alternativas que reduzam açúcar em geleias, bem como que não afetem as suas características sensoriais. Com o levantamento dos artigos avaliados, foi possível verificar que a aplicação de gomas, pectinas de baixo teor de metoxilação (BTM) e edulcorantes alternativos são uma alternativa viável para o desenvolvimento de geleias reduzidas de açúcar”, frisa.
Para a acadêmica, este é um trabalho com a cara do engenheiro de alimentos, uma vez que a indústria se depara com situações onde é preciso realizar mudanças no preparo de alimentos visando o bem do consumidor, sem que isso afete o prazer de consumir. “Precisamos que as características sensoriais do produto não sejam alteradas, mas sabemos que é necessário realizar uma mudança de hábitos alimentares nos consumidores. Posso dizer que é essa é uma pesquisa simples, onde é possível verificar quais são os aditivos alimentares utilizados para a substituição de açúcares em geleias, mas que propõem uma reflexão sobre os hábitos alimentares e o consumo excessivo de açúcar”, observa Isadora.
Compreender todos os processos e inovar
Para a orientadora, professora Dra. Luciane Colla, a ideia da pesquisa é desafiadora por muitos motivos, entre eles, o fato de a geleia ser um produto que, via de regra, precisa do açúcar para manter sua consistência.
Ela explica que a redução de açúcar, bem como a redução de outros elementos, pode trazer problemas tecnológicos: uma geleia é uma geleia por ter uma certa quantidade de açúcar, de acidez, de pectina e tudo isso influencia na textura desse produto. Dessa forma, ao reduzir o açúcar, é preciso alterar também o tipo de ingrediente que é utilizado para a formação do gel, que dá o aspecto de geleia.
A pesquisa feita pela acadêmica apontou que a indústria vem fazendo a redução do açúcar de várias formas, contudo, existe uma grande crítica quanto ao tipo de textura que é obtida, descaracterizando o produto: às vezes ela fica quebradiça, às vezes libera líquido com tempo na geladeira, e ela também perde aquela característica do gel. “A grande discussão do trabalho da Isadora também está na reflexão sobre o uso de diferentes tipos de gomas para estabilizar essa problemática. Mas também queremos trazer essa discussão sobre o quanto a engenharia de alimentos está preocupada com essa mudança. E vimos que ela se preocupa muito, justamente por sabermos que os processos não são simples, passando por uma mudança comportamental da sociedade, bem como uma mudança de paradigma na indústria”, destaca, ressaltando que o açúcar atua como um atributo sensorial: dá sabor, cor, odor e aparência.
Saborosa, mas também segura
Além da questão do sabor e da estética, Luciane pontua que existe a questão de segurança alimentar. “Sabemos que o sal e o açúcar são agentes que mudam a pressão osmótica do meio, ou seja, mudam o parâmetro de atividade de água nos alimentos. Quando mais sal e mais açúcar em um alimento, menor vai ser a atividade de água e, com isso, mais difícil fica para um microrganismo crescer nesse produto. Então, a partir do momento que mudamos essas quantidades, mudamos também as questões de segurança alimentar, já que será um ambiente novo, que dá possibilidades diferenciadas de crescimento de microrganismos”, relata.
Por isso, para a orientadora, o papel do engenheiro de alimentos é cada vez mais importante. Em sua opinião, todas essas mudanças conceituais que são necessárias para que tenhamos produtos mais saudáveis para o consumidor, vão impactar na forma como esses produtos serão feitos nas indústrias. “Nosso desafio é justamente promover essas mudanças e manter o nível elevado de segurança alimentar, cuidando também do sabor desses produtos. Será que a característica de gel na geleia é a parte mais importante desse produto? Será que podemos reduzir o açúcar, mudar um pouco a sua textura e trabalhar na conscientização do consumidor para que ele compreenda que essa mudança traz benefícios?”, questiona, instigando a sociedade a refletir.
Novos hábitos, novos profissionais
Encontrar novas metodologias para que os produtos alimentícios sejam mais saudáveis, acessíveis e ainda permaneçam saborosos é um desafio. Por isso, a formação acadêmica precisa estar atenta.
Para o coordenador do curso, professor Dr. Marcelo Hemkemeier, desde os primeiros trabalhos de conclusão de curso até as pesquisas desenvolvidas, se busca abordar temas e trabalhar aspectos que impactem no consumo, na qualidade e na saúde das pessoas. “Temos que pensar, e levando em consideração as mudanças dos últimos anos, principalmente na questão da saudabilidade, alimentos mais sustentáveis, em trabalhar tudo de forma transversal, seja no andamento do curso, ou nos trabalhos de conclusão, muitos estudantes escolhem temas que permeiam esses tópicos, envolvendo geleias, panificação, laticínios, vegetais, frutas e hortaliças”, ressalta, destacando que alguns egressos já montaram empresas com foco na produção de alimentos mais saudáveis e sustentáveis.
De acordo com ele, o olhar do curso está no processo industrial e na segurança alimentar que são as grandes funções de engenheiro de alimentos. “No novo currículo, que começa em 2021, vamos ter uma disciplina específica que será Desenvolvimento de novos produtos, porque entendemos que tanto a indústria, quanto o mercado estão demandando isso na formação dos profissionais. Alinhados com a realidade, sabemos que o engenheiro de alimentos precisa estar atualizado nestes novos processos e na nova visão que a sociedade tem dos alimentos”, considera o coordenador.
Hemkemeier destaca que o curso tem desenvolvido trabalhos na linha de aproveitamento de alguns ingredientes funcionais, como o soro, por exemplo. Ele exemplifica que o acréscimo desses ingredientes no pão, com o extrato de physalis, que é antifúngico e antimicrobiano, diminui a necessidade de adicionar um conservante artificial ao produto.
O olhar social também é parte dessa mudança. Segundo o coordenador, mais do que encontrar novos produtos, o curso quer formar profissionais capazes de atender toda a sociedade. “Quando olhamos para uma questão de substituição, não podemos pensar que ela seja voltada apenas para quem pode comprar um produto mais caro, mas temos que pensar que ele precisa ser desenvolvido de forma que possa ser processado pela indústria e distribuído para a população. A comunidade também precisa absorver esse conhecimento e, a partir daí, viver uma mudança comportamental”, opina.
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